sábado, 19 de novembro de 2011

Patifarias autárquicas

Em 1984, um senador chamado Gary Hart liderava com sobra as primeiras eleições primárias para escolha do candidato democrata ao governo dos Estados Unidos. Seria uma eleição difícil, porque o adversário era Ronald Reagan, mas nada que desanimasse o carismático congressista opositor do ator que virou um dos mais importantes mandatários norte-americanos dos últimos 50 anos.

Tudo ia bem para Hart até que um jornal estampou em primeira página uma foto dele saindo da casa da amante. Em menos de três dias o homem que prometia ser uma pedra no sapato de um presidente que recuperou a economia dos Estados Unidos tornou-se um zero à esquerda. Sua candidatura virou pó porque ele mentiu e na tradição política e eleitoral daquele país há uma incompatibilidade gigantesca entre a mentira e o exercício ético da função pública.

Muitos brasileiros sequer levariam em conta a traição conjugal de um candidato a qualquer que seja o cargo, porque culturalmente parece aceitável em uma sociedade machista que um homem possa se dar ao desfrute de manter uma amante. Uma mulher, coitada, seria execrada. Um homem, exaltado.

Mas a questão de fundo não é uma relação extraconjugal, mas a mentira que a mantém longe do conhecimento do cônjuge traído. Para o senso comum de um país como os EUA, se um político com ou sem mandato mente para sua esposa, seguramente pode faltar com a verdade perante um juiz, diante do Congresso Nacional, juntos aos eleitores antes, durante e depois de uma campanha política. Tanto pior é quando a mentira recai sobre o conjunto de contribuintes de onde se tira o dinheiro que muitas vezes financia as malfeitorias.

Por isso mesmo é que segue em um crescendo a incompreensão dos brasileiros com a manutenção no cargo de um agente público como o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, que mentiu ao negar que conhecia o dono de uma ONG que mantinha negócios com sua pasta, bem assim que tenha viajado
em aeronave alugada pelo empresário ‘ongueiro’.

A mentira de um ministro é, no mínimo, crime de responsabilidade. Ora, em circunstâncias assim, tem-se que optar entre a moralidade expressa na Constituição e essa ‘governabilidade’ que virou biombo para tentar esconder patifarias autárquicas. Para o bem do país, melhor seria optar pelo fiel cumprimento da Constituição Federal e mandar Lupi de volta para casa.

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