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O suicídio de Jamey Rodemeyer, garoto de 14 anos do oeste de Nova York que se matou depois de ser atormentado por seus colegas por ser gay, é espantoso. A história dele é um clássico do bullying: ele era agressivamente vitimado, várias vezes. Episódios horrendos como esse despertam debates sobre o cyberbullying e criam uma grande pressão para que legisladores e educadores façam algo, qualquer coisa, para impedi-lo. Mesmo assim, na pressa de encontrar uma solução, os adultos estão deixando de reconhecer como seus debates sobre bullying muitas vezes estão desalinhados com as narrativas dos jovens. Os adultos precisam começar a prestar atenção à linguagem dos jovens se quiserem que as intervenções anti-bullying tenham sucesso.
Jamey reconhecia que estava sendo agredido e pediu ajuda explicitamente, mas nem sempre esse é o caso. Muitos adolescentes que são perturbados não conseguem se identificar emocionalmente como vítimas e os jovens que praticam bullying contra outros raramente se consideram agressores. Quando um adolescente se reconhece na linguagem adulta de bullying, existem muitos custos sociais e psicológicos. É preciso admitir ser impotente ou abusivo.
Em nossa pesquisa ao longo de vários anos, entrevistamos e observamos adolescentes em todos os Estados Unidos. Com o interesse do público em cyberbullying, questionamos os jovens sobre isso, mas fomos continuamente rejeitados. Os adolescentes nos disseram várias vezes que o bullying era algo que acontecia apenas no ensino fundamental. ''Não há bullying nesta escola’' era uma frase comum.
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Isso não casava com nossas observações, então tivemos dificuldades para entender essa desconexão. Embora os adolescentes denunciassem o bullying, eles – especialmente as meninas – descreviam um conjunto de conflitos interpessoais em suas vidas como 'drama’.
Primeiro, pensamos que o drama era simplesmente um termo abrangente, referindo-se a diferentes formas de bullying, piadas, briguinhas entre amigos, separações, uniões e fofocas. Achávamos que os adolescentes viam o bullying como uma forma de drama. Mas percebemos que os dois são bem diferentes. O drama era um mecanismo de proteção para eles.
Os adolescentes dizem 'drama’ quando querem diminuir a importância de algo.
Várias vezes, os adolescentes se referiam a algo como 'apenas um drama idiota’, 'algo que as meninas fazem’, ou 'típico da escola’. Aprendemos que o drama pode ser divertido; pode ser sério ou totalmente ridículo; pode ser uma forma de obter atenção ou se sentir validado. Mas aprendemos que os jovens usam o termo 'drama’ porque ele dá poder. Descartar um conflito que realmente está machucando seus sentimentos como 'drama’ permite que os adolescentes demonstrem que não se importam com essas preocupações menores. Eles podem se poupar, enquanto se sentem superiores àqueles que os tormentam, considerando-os desesperados por atenção. Ou, se eles são os instigadores, a palavra 'drama’ permite aos adolescentes sentir que estão participando de algo inofensivo ou mesmo engraçado, em vez de admitir que machucaram os sentimentos de alguém.
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Os adultos querem ajudar os adolescentes a reconhecer a dor que está acontecendo, o que muitas vezes significa assumir a posição de vítima. Mas isso pode ser sérias consequências. Reconhecer a si mesmo como vítima – ou agressor – exige sério apoio emocional, psicológico e social, uma infraestrutura indisponível para muitos adolescentes. E quando jovens como Jamey de fato pedem ajuda, muitas vezes se decepcionam. Não só muitos adultos estão despreparados para ajudar adolescentes a fazer o trabalho psicológico necessário, mas também a posição social dos adolescentes muitas vezes exige que eles continuem enfrentando o mesmo cenário social dia após dia.
Assim como Jamey, existem jovens que se identificam como vítimas de bullying. Mas muitos jovens que participam de práticas que os adultos rotulam como bullying não as identificam como tal. Os adolescentes querem se ver no controle de suas próprias vidas; sua reputação é importante. Admitir que sofrem bullying ou, pior, que praticam bullying os coloca em uma narrativa que os faz sentir fracos e infantis.
As iniciativas anti-bullying não podem ter sucesso se fazem os adolescentes se sentirem vitimados sem oferecer-lhes o apoio para passar de vítima a dono da situação. Quando os adolescentes reconhecem que estão sofrendo bullying, os adultos precisam oferecer programas similares àqueles que ajudam vítimas de abuso. E devem reconhecer que a recuperação emocional é um processo longo e difícil.
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Se o objetivo é intervir no momento da vitimização, o foco deve ser trabalhar com o arcabouço cultural dos adolescentes, incentivá-los a ter empatia e ajudar os jovens a entender quando e onde o drama tem consequências sérias. As intervenções devem focar em conceitos positivos, como relacionamentos saudáveis e cidadania digital, em vez de começar com o enquadramento negativo do bullying. A chave é ajudar os jovens a se sentirem independentes, fortes, confiantes e capazes, sem exigir que antes eles se vejam como oprimidos ou opressores.
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