quinta-feira, 15 de março de 2012

Os sentidos da greve


Os direitos não brotam em árvores, não caem dos céus e não são favores de governos. Os direitos nascem da luta e sem ela simplesmente não existem. Essa reflexão ajuda muito na compreensão da greve como instrumento de luta pelo reconhecimento e concretização de direitos. Com essa perspectiva, todas as democracias contemporâneas consagram o direito à greve e estabelecem meios de promover e garantir seu efetivo exercício.

Mesmo estando assegurada pelo direito, a greve continua sendo vista com maus olhos e os grevistas são quase sempre considerados foras da lei. A origem disso baseia-se na ideia de que a greve surpreende, causa prejuízo, gera transtornos e afeta os que nela estão envolvidos e também os estranhos ao movimento. Diz-se que a greve é um ato de violência, uma patologia que deve ser extirpada a fim de restabelecer a paz social.

Essa visão desconhece que os conflitos são inerentes às diversas formas de organização social. Talvez não seja exagero afirmar que a harmonia se abastece do conflito. Nas relações de trabalho, em que o labor humano é vendido como meio de subsistência, o conflito faz parte de sua essência, pois aí a força de trabalho produz a riqueza de alguns e a pobreza de outros, e gera o poder de dirigir os destinos de uns e a aflição de
sentir-se nas mãos do outro.

Como meio de expressão dos conflitos no trabalho, a greve assume diversos sentidos. Corresponde ao direito à luta por direitos ou ao direito de resistência à opressão. Significa ato de legítima defesa. Indica o sentido de conversa e denúncia, porquanto, por meio dela, os trabalhadores informam, denunciam e revelam indignação à sociedade em relação ao que se passa no trabalho. É uma pausa, meio de tomar o fôlego e recuperar a liberdade. Possui a função de repensar e tentar refazer a rotina de trabalho. E serve para fortalecer a solidariedade, pois nela os trabalhadores passam a correr os mesmos riscos e se encontram na mesma esperança.

Por falta dessa compreensão, a greve tem sofrido severa rejeição de setores da sociedade e é objeto de forte retaliação das autoridades. Governos procuram criminalizá-la, recorrendo à polícia como modo de coação. Tribunais e juízes quase sempre decretam sua ilegalidade e ordenam seu fim. Compreendendo e agindo assim, desconhecem que os direitos não são estranhos à ação política nem às práticas econômicas, e terminam dificultando ou inviabilizando a luta para conquistá-los. Por tudo isso, talvez seja o momento de ver a greve com outros olhos, entendendo-a como meio legítimo da luta humana por direitos, justiça e dignidade.



ARNALDO BOSON PAES
DESEMBARGADOR DO TRT/PI

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