quinta-feira, 24 de maio de 2012

Lei para os motociclistas


No interior do país desenrola-se uma tragédia. Seres humanos estão sendo mortos ou mutilados às dezenas, centenas, talvez milhares, pelo uso irresponsável de motocicletas. Na sua grande maioria, são jovens, no auge de sua capacidade de trabalho que, quando sobrevivem ao sinistro, não apenas deixam de trabalhar como passam a depender da Previdência Social, além de onerarem suas famílias com os cuidados à sua saúde — isso para não falar do sofrimento deles mesmos. Os casos se repetem aos borbotões e apresentam características que nem de longe autorizam a utilização da palavra “acidente”.

Uma pesquisa decerto demonstraria que os mortos e feridos, na esmagadora maioria dos casos quando do “acidente”, ou não tinham carteira da habilitação para motos — aliás, muitos são analfabetos —, ou não usavam capacete, ou não obedeciam às leis de tráfego, ou consumiram álcool antes de pilotar a moto ou tudo isso de uma vez só.

Muitas dessas vítimas são proprietárias das motos em que circulam. A nossa legislação não exige a prova de habilitação para compra de uma motocicleta o que, segundo parece, é uma omissão imperdoável. Vaqueiros e trabalhadores rurais em geral, que nunca usaram um veículo automotor, sem receber qualquer instrução específica, têm se aventurado nas motos — e as consequências, às vezes, têm sido catastróficas.

Alega-se, com grande frequência e com alta dose de demagogia, que as motos facilitam a vida dos que não têm condições de comprar um carro. Pois bem, a China, país atualmente conhecido por sua tendência em privilegiar a produção e o consumo em massa, não permite, segundo Benjamin Steinbruch (As motos e as cidades, Folha de São Paulo, 13/10/2009), o uso de motos em várias de suas grandes cidades (exemplo: Pequim e Xangai).

Diz Steinbruch que “os chineses consideram falsa a ideia de que as motos facilitam o trânsito e a locomoção das pessoas. Ao circular entre os veículos, dizem, elas provocam mais problemas do que soluções porque dão origem a muitos acidentes e incidentes que param ou retardam o tráfego”. Lá, eles preferem as bicicletas elétricas por várias razões, em especial por causarem menos acidentes e produzirem menor poluição. Os fabricantes de motos, que têm legítimo interesse econômico na expansão do consumo, não são prejudicados porque redirecionam a sua linha de produção para as bicicletas elétricas.

Não estou certo de que a solução chinesa seja necessariamente boa para o Brasil, tanto mais porque aqui os índices de acidentes nas zonas rurais são tão ou mais elevados que os da cidade. De toda maneira, o mínimo que se espera, diante do volume assustador de vítimas, é que alguma medida prática seja adotada pelas autoridades para que as leis de trânsito em vigor sejam efetivamente respeitadas pelos motociclistas, pois o que temos visto diariamente é que eles parecem ser imunes ao ordenamento jurídico do país. Desgraçadamente, as leis da Física não falham jamais.




NAZARENO CÉSAR MOREIRA REIS
JUIZ FEDERAL EM PICOS/PI

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