domingo, 19 de fevereiro de 2012

Nossos pertences


“Um homem morreu intempestivamente ... Ao dar-se conta, viu que se aproximava dele um ser muito especial que não parecia nenhum ser humano, levava uma maleta consigo e disse-lhe: Bem amigo, é hora de irmos... Sou a morte. O homem, assombrado, perguntou: já?... Tinha muitos planos para breve... Sinto muito, amigo, mas é o momento da partida. O homem não se conteve e perguntou: o que trazes na maleta?. E a
morte respondeu-lhe: os teus pertences. Os meus pertences? São as minhas coisas? As minhas roupas? O meu dinheiro? Os meus carros? E minhas terras?. Não amigo, as coisas materiais que tinhas nunca te pertenceram, eram da terra. Trazes as minhas recordações? Não, amigo, essas já não vêm contigo, nunca te pertenceram, são do tempo.

Trazes meus talentos? Não, amigo, esses nunca te pertenceram... Eram das circunstâncias. Então trazes os amigos e os meus familiares? Não, amigo, eles eram do caminho. Trazes então a minha mulher e meus filhos? Também não, eles nunca te pertenceram, eram do coração. Trazes o meu corpo? Não, amigo, esse nunca te pertenceu, é propriedade da terra. Então com certeza trazes a minha alma? Não, amigo, a tua alma, ela nunca
te pertenceu também, era do universo. Aí então o homem cheio de medo, arrebatou a maleta, abriu-a e deu-se conta que ela estava completamente vazia.

Com uma lágrima de desamparo a correr dos seus olhos, o homem disse à morte: nunca tive nada?. Tivestes sim, meu amigo, os momentos que vivestes foram teus, a vida é só um momento... Um momento todo teu. Desfruta-o na totalidade. Vive agora, seja um homem bom pra todos e não te esqueças de ser feliz”.

É capaz de você também ter recebido um email desses e não ter lido por ser um tema tão batido. Mas esse negócio de morte, comportamento, avareza são pra mim, que sou cantador e contador de histórias e estórias, temas interessantes que merecem ser reprisados porque sempre existem uns desavisados que fazem ouvido de mercador para a voz da vida que a toda hora diz: nada é teu, por que então te achas melhor do que o teu semelhante? Por que pisas, ofendes, humilhas, principalmente aos menos favorecidos?.

E foi exatamente pela história acontecida com um ex-vigia meu que lembrei-me de tocar nesse assunto, para
lembrar a quem interessar possa, que da vida não levamos mesmo nada.

Conta ele que trabalhou na casa de um “barão”, como ele diz no seu simples linguajar, e que nunca foi tão humilhado numa casa como a desse sujeito. O que tinha de rico, tinha de arrogante. Disseme ele que o homem, e a família toda, era mais bruta que os “pés da burra”. Do alto de suas propriedades, carros e aviões, o homem nem pisava mais no humilde chão de todos nós, nosso lençol final. Com poucos meses que ele havia sido demitido soube que o homem tinha morrido de repente. Ele confessou pra mim que ficou triste porque tinha sentimento, mas pena não sentiu não. Foi até o velório, afinal, mesmo com toda ignorância dos integrantes daquela família, ele tinha trabalhado nove anos pra eles, até porque, precisava muito daquele serviço. Foi mesmo só para dar os pêsames. Mas ao chegar na sala, a filha do homem perguntou: o que você faz aqui, Zé? Alguém te convidou? Parece mentira, uma pergunta dessas, numa hora dessas. Aí ele me disse que baixou os olhos, deu meia volta, deu vontade de falar, mas não falou. Me afirmou que só pensou em voz baixa.”Eu só queria ver mesmo se tinha, e se tinha, qual era o tamanho das gavetas do caixão dele, para ver como ele tinha conseguido agasalhar tudo que era seu, lá dentro”. É...



LÁZARO DO PIAUÍ
ESCRITOR

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