sexta-feira, 27 de abril de 2012

Castigo duplo


No Brasil, algumas insuficiências da administração pública, de tão corriqueiras, já não causam estranhamento e será necessário um grande esforço ou desconhecimento para que consideremos fora de padrão aquilo que nunca poderia ser facilmente tolerado, fazendo-nos agir como se o anormal pudesse ser aceito, como se algo verdadeiramente ruim se faça aceitável.

Uma dessas situações anômalas é a superlotação dos presídios – antes um problema bastante limitado ao Brasil mais densamente povoado e economicamente mais pujante. Hoje, essa é uma desgraça que se abate sobre todo o território nacional.

Denúncias, fotografias e relatórios incorporam-se ao pano de fundo do noticiário, como se fizessem parte de alguma espécie de “custo Brasil” no que se refere à crescente degradação humana e à irresponsabilidade dos governantes.

Dois anos atrás, no Estado de São Paulo, a iniciativa inusitada de um juiz expôs a precariedade da situação penitenciária naquele Estado, trazendo a lume sua irracionalidade crônica. O magistrado determinou a remoção de cerca de 600 presos, amontoados em dois presídios da cidade de Franco da Rocha, onde, ilegalmente, cumpriam sua pena em regime fechado. Pela legislação, estavalhes garantido o direito de passar para o regime semiaberto.

Obviamente que uma decisão desse tipo – que se repete país afora – não encontra condições de cumprimento, face o fato sobejamente conhecido de que não existem vagas para o cumprimento de pena em regime semiaberto, tampouco para presos provisórios.

No caso da decisão do juiz paulista, se não existem vagas para presos albergados, o apenado pode permanecer em sua casa, até que o poder público solucione o problema. Isso porque, conforme o juiz, não se pode cumprir uma pena maior que a prevista em lei e amontoar pessoas em presídios é agregar ao preso mais um castigo.

Estamos, infelizmente, longe de obter uma solução para a falta de vagas no sistema prisional brasileiro. Mas há sempre a possibilidade de se corrigir um problema, antes que juízes, aplicando a lei, mandem presos para casa porque o Estado não é capaz de oferecer vagas em estabelecimentos penais onde não haja um castigo duplo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário