sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A criação do Estado do Gurgueia: Uma contribuição técnica ao debate


Quando exerci o cargo de secretário de Fazenda tive a oportunidade de estudar alguns números sobre o impacto da criação do Estado do Gurgueia, juntamente com o economista Francisco Celestino, então coordenador de Estudos Econômicos da Sefaz. Agora, que o tema volta à pauta na mídia, decidimos escrever este artigo com enfoque no campo financeiro-tributário.


O processo histórico da criação dos Estados brasileiros tem início com as transformações das Capitanias Hereditárias, prosseguindo com os desmembramentos de áreas de outros Estados já constituídos, casos de Mato Grosso do Sul e Tocantins, ou com as elevações de territórios em Estados, situação de Rondônia, Roraima e Amapá. Há também o caso da fusão do Rio de janeiro com o antigo Estado da Guanabara.


Inicialmente a criação de Estados visava, fundamentalmente, a ocupação de vazios demográficos e a manuten
ção da integridade territorial do Brasil; na segunda fase, o foco mudou para a disseminação da cultura e para a aceleração do desenvolvimento econômico e social nas regiões mais atrasadas; e, atualmente, surge outra vertente com uma clara predisposição de constituir uma nova estrutura de poder político, embora perpasse o discurso da promoção do desenvolvimento para as áreas a serem emancipadas.

Essa premissa carece de sustentação técnica, vez que a base para a promoção do desenvolvimento está na capacidade de investimentos vultosos em obras de infraestrutura e em empreendimentos produtivos, tanto pelo setor público como do setor privado, o que na conjuntura atual tem sido inviável, dado a pesada máquina burocrática que consome quase que totalmente os recursos disponíveis, que são escassos e
se tornarão mais ainda com a divisão por novas estruturas semelhantes às atuais, haja vista que no Congresso
Nacional tramitam 20 projetos de criação de novos Estados.


Fundamenta esta afirmativa o dado de que durante o ano de 2010, computando-se as receitas próprias dos Estados do Nordeste verificamos que estas garantem em média apenas 63,7% do custeio da áquina(despesas correntes), o que induz ao entendimento de que esses estados são meros repassadores
de recursos federais. Com razão os gestores públicos estão sempre a dizer que não dispõem de recursos para investimentos, portanto, de onde os novos Estados tirariam recursos para um custeio que se apresenta bilionário?

O IPEA- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada elaborou, usando dados de 2005 atualizados para 2008,
uma pesquisa segundo a qual demonstra que o custo médio de funcionamento de um novo Estado ao ano, apenas com a manutenção da máquina burocrática, seria de R$ 832 milhões, acrescidos de R$ 546,69 por cada habitante, isto tudo sem considerar qualquer gasto com investimentos.


Tomando-se por base estes dados atualizados pelo IPCA para dezembro de 2010, conclui-se que o Estado do Gurgueia, se já existisse naquele ano, teria gasto com a sua estrutura burocrática o montante de R$ 918 milhões e R$ 408 milhões com os serviços básicos prestados aos seus 676.019 habitantes, totalizando a grandiosa quantia de R$ 1,3 bilhão.

Se considerarmos que a receita tributária do Gurgueia no ano de 2010, acrescida de 30% decorrente da implantação do ICMS Substituição Tributária alcançaria no máximo R$ 101 milhões, deduzindo-se os 25% do repasse aos municípios somaria uma receita líquida de R$ 76 milhões, suficiente tão somente para bancar 5,76% dos custos da máquina e da prestação dos serviços básicos à sua população.


Como se vê, os dados aqui relatados evidenciam a inconveniência ou a prudência na criação de novos Estados no Brasil na conjuntura atual, inclusive porque o modelo de estado federado passa, necessariamente, por uma nova e profunda discussão sobre o pacto federativo, onde o papel desempenhado pela União assume cada vez mais relevância na aplicação de políticas públicas mais efetivas e que promovam o  Desenvolvimento econômico com foco nos segmentos mais excluídos da população.




FRANCISCO CELESTINO DE SOUSA
ECONOMISTA/ AUDITOR FISCAL DA FAZENDA ESTADUAL  

ANTÔNIO NETO
EX-SECRETÁRIO DE FAZENDA DO ESTADO DO PIAUÍ






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